sexta-feira, 1 de julho de 2011

O QUE É SOLIPSISMO?

O termo deriva do latim solus (só), + ipse, (mesmo), + "-ismo". A base do conceito solipsista é a negação de tudo aquilo que esteja fora da experiência do indivíduo. Seria, no caso, um ceticismo extremado. Tão extremo que a concepção do termo leva em conta, até mesmo, a inexistência do mundo, caso não haja alguém para experimentá-lo. Dessa forma, a sustentação do solipsismo é o empirismo, ou seja, a prática do indivíduo.
Na epistemologia, o solipsismo tem como perspectiva: "Nada se pode conhecer a não ser os próprios conteúdos mentais". Assim, o solipsista - aquele que tem como fundamento o solipsismo - nega tudo que esteja além dele mesmo: "Não posso saber que ao meu lado está uma janela; tudo o que sei é que tenho na minha mente a ideia ou imagem da janela, o que é bem diferente". Já na ontologia, o termo se refere a uma perspectiva mais radical, levando em conta que apenas o "eu" e as próprias experiências são reais, tudo o mais é ilusão. Isso faz com que o indivíduo acredite que nada além dele seja real, nem mesmo as outras pessoas, sendo tudo concepções mentais. Ao longo da história da filosofia, o termo e seu conceito já foram rechaçados por diversos pensadores, como Edmund Husserl e Maurice Merleau-Ponty.

Por que Nietzsche não é cristão?



Por Gerson Nei Lemos Schulz*

GUSTAV-ADOLF SCHULTZE
Friedrich Nietzsche (1844-1900) ainda hoje é um autor que chama a atenção de muitos leitores. Seja porque Foucault, Heidegger ou Sartre o tenham citado amplamente, seja porque tantos outros o chamaram de maldito (em relação à sua herança: as críticas à religião cristã). Ou ainda por causa das deturpações que sua irmã, Elisabeth Nietzsche, promoveu em suas obras; especialmente em Vontade de Potência, para agradar Adolf Hitler e os nazistas e se promover na década de 1930.
Nietzsche escreveu sobre arte (literatura e música), moral e ética, religião, antropologia, teoria do conhecimento e também é autor de um romance losó co, o Assim falou Zaratustra. A di culdade para ler Nietzsche está no fato de, além das traduções do alemão para o português nem sempre serem éis, ele não separar tais assuntos em obras sistematizadas (por exemplo, Kant - 1724/1804 - o fez), mas aqueles que querem escutar Nietzsche por meio de suas obras devem executar verdadeiro trabalho de pesquisador atento, pois são muitos os jogos de linguagem que ele usa, os trocadilhos e ironias, interjeições etc.
Mas Nietzsche era um lósofo do porvir, como gostava de salientar, e isso porque talvez, mais do que um a Feuerbach (1804-1872) ou um Schopenhauer (1788-1860), tenha vivido na própria carne seu tempo e as mazelas da Europa de m de século com a Guerra Franco-Prussiana, que abalou as bases culturais do continente.
Enquanto Feuerbach desmisti cava o cristianismo (em sua A essência do cristianismo) e Schopenhauer losofava racionalmente (aos moldes ocidentais em O mundo como vontade e como representação) sobre a ideia oriental budista da a ascese, e fazia avançar o pensamento humano para considerar a existência da possibilidade de uma "vontade cega" que guia o universo, concluindo, com isso, que não há sentido último no universo, que o mundo não está aí para o homem se deleitar com seus frutos (ao contrário, tudo está aí por mero acidente), não há planejamento, não há deuses por trás das coisas, o homem, grosso modo, para Schopenhauer, também é um acaso da "vontade cega" que comanda o universo.
FEUERBACH
Teólogo, filósofo e antropólogo nascido em Landshut, no atual território da Alemanha, Ludwig Andreas Feuerbach (1804-1872) foi um pensador humanista que se destacou por suas obras em que abordou a religiosidade, como A essência do cristianismo. Considerado um dos "jovens hegelianos", a filosofia de Feuerbach exerceu influência na obra de Karl Marx, que analisou a contribuição feuerbachiana no livro A ideologia alemã.
DOMÍNIO PÚBLICO
NIETZSCHE E AS CRÍTICAS AO CRISTIANISMO
Nietzsche não é o primeiro autor moderno a criticar a religião cristã. Feuerbach, Marx (1818-1883) e Engels (1820-1895) já o tinham feito. Feuerbach mostra que foi o homem quem criou "deus" e não o contrário, e isso se deu quando o homem projetou em um ser imaginário tudo aquilo que desejava ter: imortalidade, sabedoria, onipresença, onipotência e onisciência.
Marx mostrou que são as condições econômicas e materiais que condicionam as ideias do ser humano e que eles estão atrelados a seu horizonte histórico. Além disso, a sociedade, para Marx, é constituída pela luta de classes (que é o motor da história), sendo assim há uma luta entre proprietários dos meios de produção (burgueses) e operários (proletários), estes últimos são espoliados pelos patrões, que se bene ciam deles pela mais-valia (o lucro que o trabalhador produz e que vai para o bolso do patrão); logo Marx advoga pelo m dessa luta, ou seja, a abolição das classes sociais, o socialismo. Isso para que todos tenham acesso às benesses da vida moderna (e não apenas alguns poucos que podem pagar por isso). Consequentemente, Marx a rma que a religião também desapareceria, pois "Deus" não passa de uma criação do homem para justi car a vida de sofrimentos que tem na Terra (com ideias como pecado e redenção ou sofrimento e recompensa no além).
Mas aí surge Nietzsche com outro foco crítico contra a doutrina cristã, a moral e sua gênese. E é para entender isso que não se poderia inescrupulosamente apresentar o autor sem seu contexto histórico e sem aqueles que o antecederam. Da mesma forma como é importante avisar àqueles que tomam primeiro contato com Nietzsche e suas polêmicas declarações de que ele não con ita apenas uma das igrejas cristãs, mas todas.
CONTRAPOSIÇÃO: A ÉTICA CRISTÃ NEGA A VIDA NA TERRA
Para Nietzsche, o Ocidente, adotando a ética cristã, negou a vida real (material). Então, segundo ele, a doutrina judaico-cristã, com o conceito de "Deus castigador", moralista e juiz de homens como no Antigo Testamento, serviu apenas como um "cabresto". Jesus, com ideias como "ressurreição" e "mundo melhor" após a morte, apenas contribuiu para que todos se penitenciassem para escapar do pecado original. Mas esse pecado é impossível para Nietzsche quando ele pressupõe que o homem não tem "alma" (no sentido de algo que sobrevive após a morte) e que "Deus" não existe fora da mente humana.
O homem, então, é concebido apenas pela força da natureza e se perece com a morte. Caso isso seja verdade, infere Nietzsche que o "pecado" não passa de invenção que alimenta o medo (medo de morrer e ir para o "inferno"), medo este que é o fundamento da moral cristã. Em sua Genealogia da Moral, Nietzsche a rma que primeiramente a moral foi criada para impedir o homem de cair no niilismo e para dar explicações para a vida e seus sofrimentos. Entretanto, seu principal fator de fundamentação se constituiu no medo (NIETZSCHE, Genealogia da Moral In: Os Pensadores, p. 333). Quer dizer, o que o autor percebe de nocivo aí é que não há nenhuma relação de amor ou gratuidade com um suposto "Deus", o que há é o culto de "Deus" pelo homem porque o homem é um "covarde da vida". Teme suas mazelas e se esconde atrás de "Deus", que serve como muleta.
Nietzsche diz que é esse medo que gera a angústia diante da vida e acarreta a busca do perdão de "Deus". O problema para Nietzsche está no administrador do perdão, o sacerdote. Para Nietzsche, a lei, falando pela boca do sacerdote, transforma-se na moral vigente. Há uma máscara sobre "Deus", porque o sacerdote ganha para si o poder da lei, personi cando "Deus". E, como a lei vem de um "Deus" que precisa de intérpretes (pois os textos bíblicos são a única manifestação que o crente aceita como tal), os homens elegem o sacerdote como o intérprete de "Deus". Mas aí surge outro problema, diz Nietzsche: se "Deus" é juiz dos homens e o sacerdote (padre ou pastor cristão) é seu porta-voz, então, na realidade, é o sacerdote quem julga os homens? Sim, diz ele, porque mesmo que "Deus" exista quem dá a última palavra é o sacerdote.
Assim, o sacerdote, se é quem controla o divino (porque interpreta a lei e "sabe" o que "Deus" quer dos homens), controlando o mundo terreno e controlando as coisas da Terra, controla o comportamento das pessoas por meio da moral. Assim Nietzsche mostra como os homens se deixam aprisionar por uma metafísica, ou seja, moral cristã, que é reproduzida de geração a geração e pela qual são punidos aqueles que desejam apontar suas contradições. É por isso, conclui Nietzsche, que a moral é uma "prisão" para os homens.
Quanto ao crente (cristão), este se deixa guiar passionalmente por acreditar que o sacerdote o levará ao paraíso com a graça de "Deus". Mas, para Nietzsche, esse "Deus" (como já foi dito) é uma muleta que serve para o homem amenizar sua fraqueza carnal diante do mundo real. Logo, Nietzsche rejeita a doutrina cristã, chamando-a de "moral de rebanho". "Moral de fracos" que se unem para louvar "Deus" (o cabresto) e pedir perdão a "ele". A moral cristã que arrebanha crentes para cultuar "Deus" recruta culpados para que "ele" seja reconhecido como tal. O menosprezo pelo homem que eleva "Deus" torna-o algoz do homem. Foi por isso que Nietzsche a rmou no Anticristo: "Deus está morto".